31 de março de 2007

cover



















The Peter Gunn Theme,
de Henry Mancini, é o tema principal da série televisiva americana Peter Gunn lançada em 1958. Rapidamente esta música tornou-se um grande sucesso e símbolo da ficção policial, valendo a Mancini um Emmy e dois Grammys. Várias versões têm sido criadas por diversos músicos de jazz, blues e rock, como Ray Anthony, Brian Setzer, The Cramps, Jimi Hendrix, Aerosmith, ELP, Pulp, The Blues Brothers, Sarah Vaughan e Art of Noise, entre outros. Hoje em dia faz parte do imaginário de quase toda a gente, muitas vezes sem associação directa ao tema original.


Sarah Vaughan (Max Sedgley remix)


Art of Noise


The Blues Brothers

28 de março de 2007

nota ao mano




apenas uma nota, breve, porque as tuas palavras hoje, se calhar mais do que em qualquer outro dia, vieram para me abraçar.

eu também te leio assiduamente. também vejo o mundo pelos teus olhos.


miss singing songs with u






27 de março de 2007

sons às rodelas (IV)



















The Velvet Underground - The Velvet Underground and Nico (Verve, 1967)

"One of my rules is: never listen to your old stuff. If you do that, then you’re not a musician anymore; then you’re just a self-satisfied nostalgic idiot who’s not interested in inventing anything."
Lou Reed, em entrevista a Gabriella, NYROCK, 1998

fingimento















(...)
Vem um homem que morreu enforcado, e, chegando ao batel dos mal-aventurados, disse o Arrais, tanto que chegou:

Diabo: Venhais embora, enforcado!
Que diz lá Garcia Moniz?
Enforcado: Eu te direi que ele diz:
que fui bem-aventurado
em morrer dependurado
como o tordo na buiz
e diz que os feitos que eu fiz
me fazem canonizado

Diabo: Entra cá, governarás
atá as portas do Inferno
Enforcado: Nom é essa a nau que eu governo
Diabo: Mando-te eu que aqui irás.
Enforcado: Oh! nom praza Barrabás!
Se Garcia Moniz diz
que os que morrem como eu fiz
são livres de Satanás...

E disse-me que a Deus prouvera
que fora ele o enforcado;
e que fosse Deus louvado
que em bo'hora eu cá nascera;
e que o Senhor m'escolhera
e por bem vi beleguins;
e com isto mil latins
mui lindos, feitos de cera.

E no passo derradeiro,
me disse nos meus ouvidos
que o lugar dos escolhidos
era a forca e o Limoeiro;
nem guardião do moesteiro
nom tinha tão santa gente
como Afonso Valente
que agora é carcereiro.
(...)

Auto da Barca do Inferno, Gil Vicente, 1517

memória


















La desintegración de la persistencia de la memoria, Salvador Dalí, 1954


One had a lovely face,
And two or three had charm,
But charm and face were in vain
Because the mountain grass
Cannot but keep the form
Where the mountain hare has lain.

Memory, WB Yeats

26 de março de 2007

nas nuvens



a adriana começou por se zangar quando percebeu que não eram verdadeiras



mas no fim já não queria sair das nuvens!

tudo sobre a nossa água



coimbra tem um novo museu, dedicado à água e ao seu papel no equilíbrio ambiental. resultou de uma colaboração entre a empresa águas de coimbra e a câmara municipal, beneficiando do programa polis. é pequenino, já que se instalou no antigo edifício da estação elevatória de captação de água (cuja construção data de 1922), mas estende-se pelo parque manuel braga até ao coreto (também recuperado), onde a orquestra clássica do centro voltará a actuar ao entardecer.



inaugurou com uma pequena exposição sobre esses pedaços de algodão com que esculpimos figuras no céu.


e não podia faltar o rio!

sandra & os peixes

fui visitar o mano e encontrei isto. foi inevitável, pensei logo na minha cusca pescadora :)

25 de março de 2007

esqueci-me de te dizer

que hoje o frio só chegou ao fim da tarde. antes o dia tinha sol e calor. e ali ao lado do mondego, os parques estavam cheios de pessoas. que passeavam, jogavam, descansavam e aprendiam. eram tantas que podíamos acreditar que não havia centros comerciais de luzes fluorescentes na cidade.
e só escureceu quando desligaste.

22 de março de 2007

o homem dos mil dedos
























Carlos Paredes carregava nas mãos o peso dos sentimentos e libertava-os nas cordas. Nunca ninguém se exprimiu tão bem sem palavras. Por nós também: somos um bocadinho daquela guitarra; o som que ouvimos é a nossa voz.

«Já me tem sucedido fazer as pessoas chorar enquanto eu toco... E eu não compreendia isto, mas depois percebi que é a sonoridade da guitarra, mais do que a música que se toca ou como se toca, que emociona as pessoas.»
(em entrevista ao jornal Público, 1990)

E a guitarra é Carlos Paredes.



Os meus olhos são uns olhos,
e é com esses olhos uns
que eu vejo no mundo escolhos,
onde outros, com outros olhos,
nao vêem escolhos nenhuns.

Quem diz escolhos, diz flores!
De tudo o mesmo se diz!
Onde uns vêem luto e dores,
uns outros descobrem cores
do mais formoso matiz.

Pelas ruas e estradas
onde passa tanta gente,
uns vêem pedras pisadas,
mas outros gnomos e fadas
num halo resplandecente!!

Inutil seguir vizinhos,
querer ser depois ou ser antes.
Cada um é seus caminhos!
Onde Sancho vê moinhos,
D.Quixote vê gigantes.

Vê moinhos? São moinhos!
Vê gigantes? São gigantes!

António Gedeão, Impressão Digital (in Movimento Perpétuo, 1956)

21 de março de 2007

melhor que celebrar a poesia é receber poesia

Procura a maravilha.
Onde um beijo sabe
a barcos e bruma.
No brilho redondo
e jovem dos joelhos.
Na noite inclinada
de melancolia.
Procura.
Procura a maravilha.

Eugénio de Andrade

("para a minha fadinha", disse-me ela, sem saber que quem faz magia não sou eu. a maravilha dos dias está nos pequenos gestos)

porque o poema...

O poema são fogueiras levantadas na garganta


O poema são fogueiras levantadas na garganta
ou um sono inclinado sobre as facas.

Alguém diz, a prumo
todos os nomes queimam,
e há uma deflagração assombrosa,

a palavra acende-se
com uma árvore de sangue ao centro.


Jorge Melícias
A Luz nos Pulmões
Quasi Edisões (2000)
(também aqui)

saber falar do que não se vê

Pela voz contrafeita da poesia

Dá-nos os passos os teus passos
de manhã triunfal de cidade à solta
os gestos que devemos ter
quando a alegria descobrir os dedos
em que possa viver toda a vertigem
que trouxer da noite
os primeiros dedos do sonho
do teu sonho nosso sonho mantido
mesmo no mais íntimo abandono
mesmo contra as portas que sobre nós:
em silêncio e noite
em venenosa ternura
em murmúrio e reza
se fecharam já
mesmo contra os dias vorazes
que por todos os lados nos assaltam
e consomem
mesmo contra o descanso eterno
a viagem fácil
com que nos ameaçam vigiando
todo o percurso do nosso sono
interminável sono coração emparedado
no muro cruel da vida
desta que vivemos que morremos
assim esperando
assim sonhando
sonhando mesmo quando o sonho
ignorado recua até ao mais íntimo de cada um de nós
e é o gemido sem boca
a precária luz que nem aos olhos chega

Não digas o teu nome: ele é Esperança
vai até aos que sofrem sozinhos
à margem dos dias
e é a palavra que não escrevem
sobre as quatro paredes do tempo
o admirável silêncio que os defende
ou o sorriso o gesto a lágrima
que deixam nas mãos fiéis

Não digas o teu nome: quem o não sabe
quem não sabe o teu nome de fogo
quem o não viu entrar na sua noite
de pobre animal doente
e tomar conta dela
mesmo só pelo espaço de um sonho

O teu nome
até os objectos o sabem
quando nos pedem um uso diferente
os objectos tão gastos tão cansados
da circulação absurda a que os obrigam

As coisas também gritam por ti

E as cidades as cidades que morreram
na mesma curva exemplar do tempo
estão hoje em ti são hoje o teu nome
levantam-se contigo na vertigem
das ruas no tumulto das praças
na espera guerrilheira em que perfilas
o teu próprio sono

*

Ah
onde estão os relógios que nos davam
o tempo generoso
os dedos virtuosos os pezinhos
musicais do tempo
as salas onde o luxo abria as asas
e voava de cadeira em cadeira
de sorriso em sorriso
até cair exausto mas feliz
na almofada muito azul do sono

Onde está o amor a sublime
rosa que os amantes desfolhavam
tão alheios a tudo raptados
pela mão aristocrática do tempo
o amor feito nos braços no regaço
de um tempo fácil
perdulário
vosso

Hoje não é fácil o tempo
já não é vosso o tempo
viajantes do sonho que divide
doces irmãos da rosa
colunas do templo do Imóvel
prudentes amigos da vertigem
deliciados poetas duma angústia
sem vísceras reais
já não é vosso o tempo.

Noivas do invisível
não é vosso o tempo
Relógios do eterno
não é vosso o tempo

*

Impossível

Impossível cantar-te
como cantei o amor adolescente
colorindo de ingenuidade
paisagens e figuras reduzindo-o
à mesma atmosfera rarefeita
do sonho sem percurso no real
Impossível tomar o íngreme caminho
da aventura mental
ou imaginar-te pelo fio estéril
da solitária imaginação

Tão-pouco desenhar-te como estrela
neste céu infame
dizer-te em linguagem de jornal
ou levar-te à emoção dos outros
pela voz contrafeita da poesia

Impossível

Impossível não tentar dizer-te
com as poucas palavras que nos ficam
da usura dos dias
do grotesco discurso que escutamos
proferimos
transidos de sonho no ramal do tempo
onde estamos como ervas
pedrinhas
coisas perfeitamente inúteis
pequenas conversas de ferrugem de musgo
queixas
questiúnculas
arrotos comoventes

*

Mas de repente voltas
numa dor de esperança sem razão de ser

Da sua indiferença
agressivamente as coisas saem
Sentimo-nos cercados
ameaçados pelas coisas
e agora lamentamos o tempo perdido
a dispô-Ias a nosso favor

Porque é tempo de romper com tudo isto
é tempo de unir no mesmo gesto
o real e o sonho
é tempo de libertar as imagens as palavra!
das minas do sonho a que descemos
mineiros sonâmbulos da imaginação

É tempo de acordar nas trevas do real
na desolada promessa
do dia verdadeiro

*

Nesta luz quase louca
que se prende aos telhados
às árvores aos cabelos das mulheres
aos olhos mais sombrios
falamos de ti do teu alto exemplo
e é com intimidade que o fazemos
falamos de ti como se fosses
a árvore mais luminosa
ou a mulher mais bela mais humana
que passasse por nós com os olhos da vertigem
arrastando toda a luz consigo


Alexandre O´Neill
Poesias Completas
1951/1981
(aqui)

lola

a menina lola lomo chegou enfim.



veio com a primavera e fez-se acompanhar de poesia.
daqui a poucos dias saberemos como ela vê o nosso pequeno mundo.

19 de março de 2007

feitos de pedaços de terra
























1095. Henrique de Borgonha, casado no ano anterior com Teresa de Leão - filha ilegítima de Afonso VI, rei de Castela e Leão - como recompensa pelo seu valor na Guerra da Reconquista, consegue finalmente autonomia para o Condado Portucalense. Muitos tinham sido os Cavaleiros Normandos que se alistaram na hoste do Conde D. Henrique. Um desses Cavaleiros, Fernand Blandon, entrou neste mesmo ano como Donatário de uma terriola, até ali denominada Villa Palatiolo, como prémio da sua bravura nos campos de batalha. Assim se fundou Palatiolo de Blandon, cujo nome evoluiu ao longo dos tempos, tornando-se Paços de Brandão.

Paços de Brandão ocupa uma relevante posição na faixa litoral de Portugal. O Porto fica-lhe a 15Km, e Lisboa a 300Km, ou como desde o século XVIII era costume dizer-se "a 3 léguas Norte, do Porto e a 47 a Sul, da Capital". Pertence à província do Douro Litoral. Sua sede distrital é Aveiro e é uma das 31 freguesias das Terras de Santa Maria da Feira. O mar fica-lhe a escassos 9Km a Oeste. À maneira de muralha inexpugnável, oito concelhos rodeiam a sede comarcã feirense, a cujas justiças a terra brandoense se inclina.

Fonte

sons às rodelas (III)


















Björk - Homogenic (Elektra, 1997)

"You've got happy, sad, angry, confused, and then all the 50,000 other colours that a human feels. And if one song is just about turquoise blue - that can mean a lot of things; that [can mean the way] you feel about apples, and your brother, and your wooden bed from your childhood. "
Björk, entrevista de Emma Brockes

passageiras do vento

ser ave de rapina e planar deitada na brisa não deve ser muito diferente

impossível de descrever melhor, só possível graças à sorte e generosidade da mãe e do irmão :)

sobe, sobe, balão, sobe


















































15 de março de 2007

uma palavra em doze línguas (II)





féileacán
tauriņš
papilio
pinpilinpauxa
umvemvane
farfalla
名 蝴蝶;水性杨花女人
papillon
թիթեռնակ
balanbaalis
kelebek
mariposa







(pintura: Mariana)

enquanto não voltas



















o espaço enche-se de saudade

prémio camões 2007





















"Já reparou como os desenhos das crianças são fascinantes até aprenderem a perspectiva? Quando começam a desenhar a três dimensões, perde-se tudo."
António Lobo Antunes, em entrevista ao Diário de Notícias, 17.02.2006.
Fonte

Ler notícia aqui.

12 de março de 2007

ana

A Ana ensinou-me que o Edward Hopper é considerado um dos precursores da pop art, por causa do grafismo presente em alguns dos seus quadros,















e enquanto me dizia que nas suas obras parecia ser sempre domingo,


















lembrei-me do poema destinado a haver domingo, da Natália Correia


Bastam-me as cinco pontas de uma estrela
E a cor dum navio em movimento
E como ave, ficar parada a vê-la
E como flor, qualquer odor no vento.

Basta-me a lua ter aqui deixado
Um luminoso fio de cabelo
Para levar o céu todo enrolado
Na discreta ambição do meu novelo.

Só há espigas a crescer comigo
Numa seara para passear a pé
Esta distância achada pelo trigo
Que me dá só o pão daquilo que é.

Deixem ao dia a cama de um domingo
Para deitar um lírio que lhe sobre.
E a tarde cor-de-rosa de um flamingo
Seja o tecto da casa que me cobre

Baste o que o tempo traz na sua anilha
Como uma rosa traz Abril no seio.
E que o mar dê o fruto duma ilha
Onde o Amor por fim tenha recreio.


E assim domingo rima com pintura e com poesia.
E hoje rima com Ana :)

11 de março de 2007

98 anos e pronto para as curvas


















"Não se trata nem de um filme científico, histórico ou patriótico, nem de carácter propriamente biográfico, mas sim de uma ficção de teor romanesco, evocativa da grandiosa gesta dos Descobrimentos Marítimos em si, com a novidade lógica de que, afinal, Cristóvão Colombo era português, nascido na vila alentejana de Cuba e, por tal razão, ter dado à maior ilha por ele descoberta no mar das Antilhas o nome da sua terra natal – Cuba."
Manoel de Oliveira

Fonte: http://www.publico.clix.pt
Fotografia de Pedro Ferreira, aqui

sons às rodelas (II)



















Frank Zappa - Hot Rats (Rykodisc, 1969)

"It is easier to make somebody mad than to make somebody love. And seeing as how hate is the absolute negative of love, if you can evoke hate and it's really there, you can polarize it, and then you really could have love."
Frank Zappa, entrevista de Frank Kofsky

xerém

ir ao Algarve,
descobrir o sabor desta palavra.








1 kg de amêijoas ;
100 grs de toucinho fumado ;
100 grs de chouriço ;
100 grs de presunto ;
200 grs de farinha de milho ;
1 dl de vinho branco ;
sal q.b. ;
pimenta q.b.

Numa tigela lave as amêijoas, de preferência médias e «cristãs», em água fria, a fim de as libertar de impurezas que possam conter. Em seguida, cubra-as com água do mar, cerca de 4 a 5 horas. No caso de não ter acesso a água do mar, utilize água doce temperada com sal.
Corte o toucinho e o presunto em tiras pequenas e o chouriço às rodelas.
Frite-os numa frigideira, em lume brando.
Retire as amêijoas da água. Coza-as num tacho, cobertas de água, cerca de 8 a 10 minutos.
Escorra o líquido onde as cozeu, tendo o cuidado de o passar por um passador fino. Tire o miolo das amêijoas. Deite este num tacho, junte o caldo da cozedura, adicione o vinho e leve ao lume, deixando ferver um pouco.
Peneire a farinha com a ajuda duma peneira.
Retire o tacho e, fora do lume, adicione a farinha para não encaroçar.
Leve novamente ao lume e deixe cozer, mexendo de vez em quando. Junte as carnes e sirva bem quente.

(fonte: http://www.gastronomias.com/portugal/algarve076.html)

10 de março de 2007

bilal
























A acção desenrola-se num futuro relativamente próximo, durante o século XXI. Nike Hatzfeld possui uma memória extraordinária que lhe permite recordar o passado até ao dia do seu nascimento. Mas esta memória excepcional não convém a toda a gente: a Obscurantis Order, uma organização sectária oculta que procura destruir O Pensamento, A Ciência, A Cultura e A Memória, procura Nike. Assim se inicia uma luta entre a Obscurantis Order e o FBII (Federal Bureau of International Investigation)...

La Tétralogie du Monstre, de Enki Bilal:
Le Sommeil du Monstre (1998)
Trente-deux Décembre (2002)
Rendez-vous à Paris (2006)
Quatre? (lançamento a 22 de Março de 2007)
Fonte: http://bilal.enki.free.fr


Rappelez-vous l'objet que nous vîmes, mon âme,
Ce beau matin d'été si doux:
Au détour d'un sentier une charogne infâme
Sur un lit semé de cailloux,

Le ventre en l'air, comme une femme lubrique,
Brûlante et suant les poisons,
Ouvrait d'une façon nonchalante et cynique
Son ventre plein d'exhalaisons.

Le soleil rayonnait sur cette pourriture,
Comme afin de la cuire à point,
Et de rendre au centuple à la grande Nature
Tout ce qu'ensemble elle avait joint;

Et le ciel regardait la carcasse superbe
Comme une fleur s'épanouir.
La puanteur était si forte, que sur l'herbe
Vous crûtes vous évanouir.

Les mouches bourdonnaient sur ce ventre putride,
D'où sortaient de noirs bataillons
De larves, qui coulaient comme un épais liquide
Le long de ces vivants haillons.

Tout cela descendait, montait comme une vague
Ou s'élançait en pétillant
On eût dit que le corps, enflé d'un souffle vague,
Vivait en se multipliant.

Et ce monde rendait une étrange musique,
Comme l'eau courante et le vent,
Ou le grain qu'un vanneur d'un mouvement rythmique
Agite et tourne dans son van.

Les formes s'effaçaient et n'étaient plus qu'un rêve,
Une ébauche lente à venir
Sur la toile oubliée, et que l'artiste achève
Seulement par le souvenir.

Derrière les rochers une chienne inquiète
Nous regardait d'un oeil fâché,
Epiant le moment de reprendre au squelette
Le morceau qu'elle avait lâché.

- Et pourtant vous serez semblable à cette ordure,
A cette horrible infection,
Etoile de mes yeux, soleil de ma nature,
Vous, mon ange et ma passion!

Oui! telle vous serez, ô la reine des grâces,
Apres les derniers sacrements,
Quand vous irez, sous l'herbe et les floraisons grasses,
Moisir parmi les ossements.

Alors, ô ma beauté! dites à la vermine
Qui vous mangera de baisers,
Que j'ai gardé la forme et l'essence divine
De mes amours décomposés!

Une Charogne, Charles Baudelaire

enki
























Nova Iorque, 2095.
Dentro de uma pirâmide flutuante sobre Manhattan, os deuses do antigo Egipto julgam Horus, um deus com corpo de homem e cabeça de falcão. Em baixo, na cidade, existe uma misteriosa mulher de cabelo azul que derrama lágrimas azuis, Jill Bioskop. Ela não sabe mas o deus Horus cruzou todo o universo para a conhecer. Horus foi condenado à morte pelos seus pares e tem sete dias de vida, sete dias para encontrar Jill no meio da confusão da cidade, seduzi-la e possuir o seu corpo. Só ela tem capacidade de engravidar de um deus, o que concederia a imortalidade a Horus. Para o conseguir, Horus toma o corpo de Nikopol, um prisioneiro político que foi congelado há trinta anos por saber demais e acabou de fugir. Horus, Nikopol e Jill...

Immortel (Ad Vitam), um filme de Enki Bilal, 2004
Fonte: http://www.immortel-lefilm.com


Le vin sait revêtir le plus sordide bouge
D'un luxe miraculeux,
Et fait surgir plus d'un portique fabuleux
Dans l'or de sa vapeur rouge,
Comme un soleil couchant dans un ciel nébuleux.

L'opium agrandit ce qui n'a pas de bornes,
Allonge l'illimité,
Approfondit le temps, creuse la volupté,
Et de plaisirs noirs et mornes
Remplit l'âme au delà de sa capacité.

Tout cela ne vaut pas le poison qui découle
De tes yeux, de tes yeux verts,
Lacs où mon âme tremble et se voit à l'envers...
Mes songes viennent en foule
Pour se désaltérer à ces gouffres amers.

Tout cela ne vaut pas le terrible prodige
De ta salive qui mord,
Qui plonge dans l'oubli mon âme sans remords,
Et charriant le vertige,
La roule défaillante aux rives de la mort!

Le Poison, Charles Baudelaire

7 de março de 2007

anfiteatro de zoologia

















Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!

Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.
Quem que passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.

Fernando Pessoa
Mensagem
(edição ilustrada por Pedro Sousa Pereira,
e que chegou até mim por uma bolha muito especial :)

5 de março de 2007

sons às rodelas (I)



















Tricky - Maxinquaye (Island Records, 1995)

"Technically I'm totally naive, and emotionally I'm fucked up."
Tricky, 1995

simplesmente vivendo














Estou cansado da inteligência.
Pensar faz mal às emoções.
Uma grande reacção aparece.
Chora-se de repente, e todas as tias mortas fazem chá de novo
Na casa antiga da quinta velha.
Pára, meu coração!
Sossega, minha esperança factícia!
Quem me dera nunca ter sido senão o menino que fui…
Meu sono bom porque tinha simplesmente sono e não ideias que esquecer!

Meu horizonte de quintal e praia!
Meu fim antes do princípio!

Estou cansado da inteligência.
Se ao menos com ela se percebesse qualquer coisa!
Mas só percebo o cansaço no fundo, como baixam na taça
Aquelas coisas que o vinho tem e amodorram o vinho.

Álvaro de Campos

(foto: o pensador, de Auguste Rodin)

4 de março de 2007

adivinha

o que é que o robocop e uma batedeira eléctrica têm em comum?














um serão bem passado!
obrigada, meninos, já estou com saudades.

fantasporto 2007: e o vencedor é...


















El Laberinto del Fauno situa-nos em 1944, quinto ano de paz, e conta a apaixonante viagem de Ofelia, uma menina de 13 anos que se muda com sua mãe, Carmen, em avançado estado de gravidez, para uma pequena aldeia onde está destacado Vidal, um cruel capitão do exército franquista, novo marido de Carmen, por quem Ofelia não sente afecto algum.

A missão de Vidal é acabar com os últimos focos de resistência republicana, escondida nas montanhas da região.

Também ali se encontra o moinho onde Vidal tem o seu centro de operações. Ali aguardam-nos Mercedes e o doutor que se encarregará do delicado estado de saúde de Carmen.

Uma noite, Ofelia descobre as ruínas de um labirinto onde se encontra com um fauno, uma estranha criatura que lhe faz uma revelação incrível: Ofelia é na realidade uma princesa, última da sua linhagem, pela qual os seus esperam há muito tempo. Para poder regressar ao seu reino mágico, a menina deverá enfrentar três provas antes da lua cheia. No decurso desta missão, fantasia e realidade abraçam-se dando origem a uma maravilhosa história onde a magia que rodeia Ofelia nos transporta para um universo único, cheio de aventuras e emoção.

El Laberinto del Fauno, um filme de Guillermo del Toro
Fonte: http://www.ellaberintodelfauno.com

3 de março de 2007

de olhos postos na lua

porque hoje é noite de bruxedos e feitiçarias!
(será que a cicília consegue ver?)

carta para amanhã















Não sei, meus filhos, que mundo será o vosso.
É possível, porque tudo é possível,
que ele seja aquele que eu desejo para vós.
Um simples mundo,
onde tudo tenha apenas a dificuldade
que advém de nada haver que não seja simples e natural.
Um mundo em que tudo seja permitido,
conforme o vosso gosto, o vosso anseio, o vosso prazer,
o vosso respeito pelos outros, o respeito dos outros por vós.
E é possível que não seja isto,
nem seja sequer isto o que vos interesse para viver.
Tudo é possível,
ainda quando lutemos, como devemos lutar,
por quanto nos pareça a liberdade e a justiça,
ou mais que qualquer delas
uma fiel dedicação à honra de estar vivo.
Um dia sabereis que mais que a humanidade
não tem conta o número dos que pensaram assim,
amaram o seu semelhante no que ele tinha de único,
de insólito, de livre, de diferente,
e foram sacrificados, torturados, espancados,
e entregues hipocritamente à secular justiça, para que os liquidasse
«com suma piedade e sem efusão de sangue».
Por serem fiéis a um deus, a um pensamento, a uma pátria,
uma esperança,
ou muito apenas à fome irrespondível que lhes roía as entranhas,
foram estripados, esfolados, queimados, gaseados,
e os seus corpos amontoados
tão anonimamente quanto haviam vivido,
ou suas cinzas dispersas para que delas não restasse memória.
Às vezes, por serem de uma raça, outras por serem de uma classe, expiaram todos os erros que não tinham cometido
ou não tinham consciência de haver cometido.
Mas também aconteceu e acontece que não foram mortos.
Houve sempre infinitas maneiras de prevalecer,
aniquilando mansamente, delicadamente,
por ínvios caminhos quais se diz que são ínvios os de Deus.
Estes fuzilamentos, este heroísmo, este horror,
foi uma coisa, entre mil, acontecida em Espanha
há mais de um século e que por violenta e injusta
ofendeu o coração de um pintor chamado Goya,
que tinha um coração muito grande, cheio de fúria e de amor.
Mas isto nada é, meus filhos.
Apenas um episódio, um episódio breve,
nesta cadeia de que sois um elo (ou não sereis) de ferro
e de suor e sangue
e algum sémen a caminho do mundo que vos sonho.
Acreditai que nenhum mundo,
que nada nem ninguém vale mais que uma vida ou a alegria de tê-la.
É isto o que mais importa - essa alegria.
Acreditai que a dignidade em que hão-de falar-vos tanto
não é senão essa alegria que vem de estar-se vivo
e sabendo que nenhuma vez alguém está menos vivo
ou sofre ou morre para que um só de vós resista
um pouco mais à morte que é de todos e virá.
Que tudo isto sabereis serenamente, sem culpas a ninguém,
sem terror, sem ambição,
e sobretudo sem desapego ou indiferença, ardentemente espero. Tanto sangue, tanta dor, tanta angústia,
um dia - mesmo que o tédio de um mundo feliz vos persiga -
não hão-de ser em vão.
Confesso que muitas vezes,
pensando no horror de tantos séculos de opressão e crueldade, hesito por momentos e uma amargura me submerge inconsolável. Serão ou não em vão?
Mas, mesmo que o não sejam,
quem ressuscita esses milhões, quem restitui não só a vida,
mas tudo o que lhes foi tirado?
Nenhum Juízo Final, meus filhos,
pode dar-lhes aquele instante que não viveram,
aquele objecto que não fruíram,
aquele gesto de amor que fariam «amanhã».
E, por isso, o mesmo mundo que criemos
nos cumpre tê-lo com cuidado, como coisa que não é nossa,
que nos é cedida para a guardarmos respeitosamente
em memória do sangue que nos corre nas veias,
da nossa carne que foi outra,
do amor que outros não amaram porque lho roubaram.

Carta a meus filhos sobre os fuzilamentos de Goya

2 de março de 2007

a água dissolve o sal e fica só o azar




















O tempo passa e as pessoas esquecem. Pior do que isso, a sociedade também esquece. É o mal de ser formada por pessoas... Era entregá-los todos à PIDE... Qual salvador, qual quê!

Felizmente há "alienados" que se inspiram, antecipando-se à História:

António de Oliveira Salazar.
Três nomes em sequência regular...
António é António.
Oliveira é uma árvore.
Salazar é só apelido.
Até aí está bem.
O que não faz sentido
É o sentido que tudo isto tem.

Este senhor Salazar
É feito de sal e azar.
Se um dia chove,
A água dissolve
O sal,
E sob o céu
Fica só azar, é natural.
Oh, c'os diabos!
Parece que já choveu...

Coitadinho
Do tiraninho!
Não bebe vinho.
Nem sequer sozinho...

Bebe a verdade
E a liberdade.
E com tal agrado
Que já começam
A escassear no mercado.

Coitadinho
Do tiraninho!
O meu vizinho
Está na Guiné
E o meu padrinho
No Limoeiro
Aqui ao pé.
Mas ninguém sabe porquê.

Mas enfim é
Certo e certeiro
Que isto consola
E nos dá fé.
Que o coitadinho
Do tiraninho
Não bebe vinho,
Nem até
Café.

Fernando Pessoa (1935)

ps. Há 40 anos este post, no mínimo, daria direito a prisão e tortura. Será que isso não significa nada?

22.2.07 (ou outro dia ou outro mês ou outro ano)















Just a perfect day,
Drink Sangria in the park,
And then later,
when it gets dark,
We go home.
Just a perfect day,
Feed animals in the zoo
Then later, a movie, too,
And then home.
Oh it's such a perfect day,
I'm glad I spent it with you.
Oh such a perfect day,
You just keep me hanging on,
You just keep me hanging on.
Just a perfect day,
Problems all left alone,
Weekenders on our own.
It's such fun.
Just a perfect day,
You made me forget myself.
I thought I was someone else,
Someone good.
Oh it's such a perfect day,
I'm glad I spent it with you.
Oh such a perfect day,
You just keep me hanging on,
You just keep me hanging on.
You're going to reap just what you sow,
You're going to reap just what you sow,
You're going to reap just what you sow,
You're going to reap just what you sow...


Lou Reed
Perfect Day
Transformer (1972)